19/12/2018

Divagações

Frida Kahlo and Chavela Vargas, 1950s

Um sorriso sincero
Solta-se da minha alma plena
Em aberto para a tua
Que se estabelece em mim
Como o sol do mundo
Ironia de uma existência
Em tudo sem o ser vivente
Mas o que é que isso interessa
Na essência que se perde
Se não há o gargalhar da vida




07/06/2018

Espelhos do olhar...

Imagem encontrada na net sem referência ao autor 

Olhar deslavado, espelho de ti
Deambulante nesses becos
Que te consomem até ao fim

Tua inocência há muito perdida
Revela-se agora nos ecos
Da tua voz profunda e urdida
Na miséria do ser passageiro
Preso aos ilimites da ambição
Aproxima-se o suspiro derradeiro
Se não se intervir no coração
Daquele que é o bem primeiro

Essência de todas as vidas
Não há como não o resgatar
Antes que se faça tarde
E haja alvoradas invertidas
Impossibilitadas de recuperar
O amanhecer mais profundo
Na fogueira que ainda arde
Para dar luz ao mundo 

Respeite-se o próprio Eu
Nas investidas da evolução
Para que o universo seja seu



04/06/2018

Viagens

Imagem encontrada na net sem referência ao autor 

Envolta em fulminantes paixões, percorro campos de intensa fertilidade… e vou ao fundo de mim. Umas vezes à deriva, outras por percursos estrategicamente definidos, há uns momentos em que contemplo jardins e trago comigo o perfume das flores e outros em que vou às profundezas do desencanto e trago rasgadas na pele as cicatrizes dos espinhos. Mas sempre com a certeza que é plena a descoberta. Plena e enriquecedora, porque cada viagem é uma lição.
Só não quero é ir em vão, porque ir em vão é nada e eu quero tudo. Tudo o que o meu Eu possa aprender. Quero o equilíbrio a que me obrigam os declives dos vales e o domínio das vertigens nas subidas às montanhas. Quero a acalmia da planície e o ritmo das ondas do mar, o frio e o calor, a chuva e o sol.
Quero ser eu… ser eu até morrer!  




23/05/2018

O Sonho do João - Parte IV

Pintura de Nívea Lopes Prado


Viu um mundo desconhecido.
Tão diferente e tão igual, na beleza
e nas sensações que experimentou.
Sentia-se bastante mais enriquecido,
quando voltou para  a terra
e desceu da estrela, com total destreza.
Despediu-se da companheira
e no momento, houve algo em que pensou.
Algo que o fez sentir tristeza.
Em algumas zonas do planeta, viu guerra.




Não era bonito de se ver,
imagens de tanto sofrimento.
Aqueles senhores que fazem a guerra
não teriam nenhum sentimento?
O João pensou que, com certeza,
haveria uma maneira de resolver
os conflitos dessa gente grande.
Trocar por esperança, a avareza
do mal que se expande
e entrega-la às crianças a crescer.  




21/05/2018

O Sonho do João - Parte III

Quadro do pintor espanhol Pere Borrell del Caso

Mesmo a medo, ele avançou.
Não era pessoa de desistir
e o sonho era tão forte,
que lhe deu a força para subir.
De uma só vez, escalou a altura.
Percebeu como a estrela era macia
e deitou-se de barriga para baixo.
Apoiado nos cotovelos, viu noite escura
e a terra coberta de maresia,
àquela hora da brisa do norte.




Era uma visão limitada.
Percebeu, quando iniciou a subida
e o universo começou a crescer.
Ficava mais pequeno, na verdade,
mas via cada vez mais zonas,
 que sempre sonhou conhecer.
O planeta onde morava,
que todos lhe diziam ser azul,
apenas o via ficar brilhante
à medida que deslizava para sul.




E quando a estrela descia em altura,
via tudo muito mais definido.
 No mundo, as diferenças surgiam
a cada mudança de posição.
Quando passou no hemisfério norte,
sentiu frio e muita tremura,
enquanto no sul, sentiu o pleno Verão.
No oriente, encontrava dia,
ao mesmo tempo que, indo a ocidente,
passeava na escura noite.




18/05/2018

O Sonho do João - Parte II


Pintura de Cesare Pergola

Levantou-se e foi para a janela.
Pôs-se a olhar para o céu,  
com a expressão de quem sonha.
Viu uma centelha luminosa,
que avançava no escuro de breu.
- Mas que imagem tão bela!
Exclamou, com voz melodiosa.
Não acreditava em tão bela visão.
Era uma sorte tamanha,
encontrar ali a sua solução.



Aproximando-se pouco a pouco,
a centelha transformou-se em estrela.
- Não, não posso estar louco…
- baixinho, o João murmurou.
De olhos arregalados, olhou para ela.
Viu-a pôr-se a jeito para ele subir,
mas ele assustou-se e recuou.
- Com certeza, estou a dormir,
as estrelas não entendem a gente,
nem sabem o que a gente sente.


Ainda assim, a estrela ficou ali,
como que a chama-lo.
Não se lhe ouvia a voz,  
era apenas um luminoso clarão,
mas no coração, o João sentia
que devia confiar e ir.
Como que a encoraja-lo,
algo dentro de si lhe dizia:
- a estrela está aqui só por ti, 
para te levar pelo céu a passear.  



17/05/2018

O Sonho do João - Parte I

Pintura de Marcela Oliveira de Faria

O João tinha um sonho,
um sonho muito audaz.
Sonhava ver o mundo
lá de cima de uma estrela,
mas não sabia se era capaz.
Às vezes, até conseguia vê-la,
por uma fracção de segundo.  
E então, com o seu ar risonho,
imaginava-se a descolar.
Sobre ela, subir aos céus e viajar.





Mas tudo não passava
de um delírio da imaginação.
Logo tornava a pôr os pés no chão
e de cabeça baixa, caminhava
por todo o seu jardim
sem acreditar que não voava.
Ia do princípio ao fim,
à espera de encontrar a solução.
Quem procura sempre acha,
desistir do sonho é que não.





Até que um dia, pela noite,
já deitado na sua cama,
contava carneiros para adormecer.
O sono tardava em chegar,
não sabia o que havia de fazer.
Os pensamentos não paravam,
atingiam-no como açoites,
ou como sentimento que chama,
com a urgência de encontrar 




06/05/2018

A Partilha

Pintura: As Irmãs de Renoir

Elas eram grandes amigas. Partilhavam as brincadeiras, os segredos e as confidências de criança… e partilhavam também o caminho para a escola. Naquele tempo, lá no longínquo início dos anos cinquenta do século XX, as escolas ficavam longe, para as meninas e meninos que moravam no campo. Por vezes, percorriam diariamente longas distâncias a pé. Aqueles que tinham o privilégio de poder ir à escola. Quantas vezes, ou porque os pais precisavam do trabalho deles, ou porque não estavam despertos para os benefícios da escolaridade, simplesmente não iam.
Elas as duas, uma porque os pais podiam prescindir do seu trabalho, outra porque os pais nem trabalho tinham para a ocupar, iam. Todos os dias de manhã, com a bolsa dos livros, cadernos e lápis às costas e a lancheira na mão, andavam os quilómetros que as separavam de um futuro mais iluminado pelo saber ler e escrever.
Na lancheira levavam o almoço, e era ai que estava o que as distanciava. Mas que mais que isso as aproximava. A uma, a mãe procurava sempre os melhores “petiscos” para lhe enviar merendas variadas, à outra a mãe só tinha cebola frita com pão para lhe enviar. Mas, porque eram grandes amigas, a que levava merendas variadas sempre as partilhava com a amiga.




Há mães que nos inspiram para a uma certa maneira de ser, apenas com as suas histórias de vida.  




17/04/2018

Mulher Primavera

Foto encontrada na net sem referência ao autor 

Primavera
Assume-te fecunda
De novas vidas a florescer
No teu corpo de mulher
Desnuda de todo o pudor
É teu o poder da gestação
Acto quase transcendente
O de dar novas vidas à vida
No chão que germina a semente
Em teu ventre de fémea
Sempre a atrair sedução
Há a magia da reprodução
E a história de outras eras

Porque tu és mulher, Primavera! 



16/04/2018

Em "Acrescenta Um Ponto Ao Conto"


Em “Acrescenta Um Ponto Ao Conto” escrevemos contos a várias mãos. Semanalmente, um dos participantes escreve um capítulo que faz parte da história que nesse momento estamos a desenvolver. Não é fácil pegar num enredo que vem de trás e dar-lhe continuidade de forma coerente e criativa, mas é uma experiência enriquecedora. Nem sempre o rumo que a história toma é aquele que escolheríamos, e por vezes até nem gostamos, mas aceitamo-lo, trabalhamo-lo e no fim conseguimos que seja nosso.
Claro que para tudo isto é necessário que haja abertura de espírito e por isso felicito os meus companheiros de escrita.

Esta semana foi a minha vez de acrescentar um capítulo ao conto “Voar Sem Asas”






13/04/2018

Ti Alfredo

Fotografia©Maria João Solano Silva


“Ti Alfredo”… para os alegretenses e para tantos outros por cujas terras passava a alvorecer festas e romarias. Mestre na sua arte. Todos os anos, no dia quinze de Agosto pelas sete da manhã, lá estava ele no alto da muralha a anunciar o início dos festejos. Festas em honra de Nossa Senhora d’Alegria, das mais antigas do Alentejo e quiçá do país. O momento era de emoção, era o momento que acordava toda uma população, ansiosa por cumprir a tradição que há nascença herdara. E ele sabia-o: demonstrava-o pela forma minuciosa com que fazia cada sequência de fogo. Era diferente em cada festa. As casas de família, cheias com os residentes e com os que regressavam, ano após ano, sempre naquela data, despertavam assim durante aqueles dez ou quinze minutos de estrondosa alegria. De seguida, ouvia-se a banda. Por todas as ruas da vila, a banda soltava melodiosos acordes e instalava-se o clima de festa, que durava pelos próximos dois ou três dias.
A banda, essa ainda continua a acordar a população, todos os anos, no dia quinze de Agosto, pelas sete da manhã. Mas o “Ti Alfredo”, nunca mais soube nada dele. Os “Ti Alfredos” já não podem alvorecer festas e romarias.




02/04/2018

Saio Pela Tardinha - in Alegrete em Poesia




Saio pela tardinha,
sentindo o aroma das flores
e a brisa que refresca a noite,
anunciando-se mansinha,
traz com ela os seus odores.

Mescla de alma com sentimento,
frutos maduros e roseirais,
há no ar um encantamento
ao ouvir o canto dos pássaros,
que se espraiam nos beirais.

Embalo dos meus sonhos, 
do meu eu mais profundo.
Mesmo querendo mais, 
retorno sempre cá, do mundo
onde me exponho.

Para não permitir que adormeça,
no meu ser dolorido,
a força do meu coração.
Embora reconheça com emoção,
amor assim jamais será esquecido. 


          Esta é uma obra simples e singela - como são as coisas belas da vida - onde se reúnem alguns poetas de Alegrete, que com muita honra coordenei. 




30/03/2018

Renovação

Pintura de Juliane Mercante


Em qualquer dia, como todos os dias, a vida renova-se. Renovam-se os propósitos, renovam-se as vontades, renovam-se as certezas e também as dúvidas. Renova-se a existência de uma vida mais ou menos vivida. Porque é assim, a grande proeza de viver: uma caminhada com avanços e recuos por percursos mais ou menos sinuosos. Decorrentes em felicidade, quando os passos são em frente. Envoltos em tristeza, quando é preciso voltar atrás.
É uma lição para se aprender aos poucos, sem importar quantos são os recuos. Porque não têm importância os passos dados atrás, se eles servirem para impulsionar o balanço que é preciso para ir mais além. Ou as paragens para descansar, porque é preciso retemperar as forças que nos movem.
Sonhos, fé, esperança… tantas são as vestes com que se apresentam. Cada qual para sua ocasião. Mas na verdade, são as forças que cada um descobre em si para o simples acto de viver.
São forças em constante renovação.




21/03/2018

Pétalas ao vento... no Dia da Poesia

Imagem © Amanda Cass


Pétalas ao vento
Neste dia de aragem fria
Chegou vestida de Inverno
A Primavera
Mas lá fora, o sol brilha
A desafiar os cachecóis
E as almas sombrias
A dar luz ao pensamento
Porque todo o sentimento
Será eterno
Se lhe dermos a primazia
De ser o único dos sóis
Reinantes da sua era
Ah… que delírios eu invento
Só porque sinto dentro de mim
A inquietação das palavras
Feitas em poema
E hoje, dizem: é dia da Poesia
                               … mas eu sinto-a em qualquer dia!


17/03/2018

Caminhos de Espinhos


Um dia…
caminhei sobre espinhos
e senti os meus pés sangrar.
Pensei que não aguentaria a dor
e tive vontade de parar,
terminar ali o meu caminho,
que a vida não tinha mais valor.

E nesse dia…
abandonei-me ao desespero
que a minha dor alimentava.
Balançou dentro de mim
tudo aquilo em que acreditava.
Sentimento que sempre, enfim
me encurrala onde me esgueiro.

Mas o dia…
não era para acabar ali,
nem as voltas do caminho.
Era só mais um alibi
para a minha alma revoltosa
aprender a não temer os espinhos,
que são eles que levam às rosas. 



08/03/2018

Dia Internacional da Mulher

Imagem © Sylvie Facon


Não foram festas nem flores que levaram a que se escolhesse este dia para Dia Internacional da Mulher e confesso que também não gosto de dias marcados para relembrar ou celebrar seja o que for, no entanto hoje, em pleno século XXI, o mundo ainda nos dá motivos para recordarmos este dia. Mas não só às mulheres, penso eu… porque não é de género que se trata.
Mulher, eu sou todos os dias. E beijos, abraços e flores, gosto de receber em qualquer data. Assim como também gosto de dar, indiferentemente da ocasião. Gosto de receber sem saber porquê, de dar sem obrigação. Não gosto de diferenciações, nem de igualdades sem razão. Cada um na missão que lhe cabe…

… gosto mesmo é de paridade!




           Dia Internacional da Mulher