Capítulo
78
(Luisa
Vaz Tavares)
Era,
agora, só um. Ou menos que um. Afinal que nesta aritmética do amor o resultado
nunca é linear. As perdas são sempre mais perdas e os ganhos maiores que um
simples algarismo. Ou dois. Ou três, ou quantos cabem num universo.
Ai,
Madalena, Madalena… quantos dos nossos sonhos se esfumaram!... E porquê?
Porquê? Diz-me porquê. Porque sucumbimos nós às convenções de uma sociedade
retrógrada? À mesquinhez dos espíritos, ao espartilhamento das almas, às aparências
ostensivas de felicidade. O nosso pecado era amar. Tão só isso, amar!
Procurámos refúgios e subterfúgios para que ninguém nos condenasse na pureza do
nosso segredo, tolerámos gajos nas nossas camas. Coitados, não sabiam eles que
eram as máscaras das nossas essências, daquilo que verdadeiramente eramos.
Amantes de espírito e alma. Pois, que o corpo é fácil de partilhar, agora a
alma, isso já é outra coisa. Partilhar a alma é a profundidade que rompe a
pele.
O
Luís, lembras-te do Luís? Encontrei-o logo ao sair da prisão. Foi dos poucos
que me rompeu a pele. Ainda cheguei a pensar que me apaixonaria por ele, mas
não, não era esse o meu credo. O meu corpo, a minha alma, todo o meu Ser, rezava
por outra cartilha. A tua cartilha, Madalena. A nossa. Aquela que escondíamos
no meio dos nossos lençóis, embrenhada na lascívia do nosso segredo. Nunca a
lascívia se apresentou tão pura. Sim, que o nosso amor era puro. Apenas
profanado pelo segredo de uma sociedade hipócrita.
Quanta
hipocrisia, meu amor! Quisemos ludibriar o destino e foi ele que nos ludibriou
a nós. Separando-nos sempre. Primeiro por aqueles muros da prisão, e agora… ai
agora, separou-nos pela ténue linha da vida.
O
que é que eu faço, minha Madalena? Continuo a fingir que a palavra lésbica não
é o conceito que me define? Ou dispo o meu corpo para que o mundo o coma enquanto
trespasso a linha da vida? E… espera por mim, Madalena!
-
Teresa… Teresa… acorda mulher. Vá lá, que tens de ir à polícia. Querem-te lá…
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